Negócios do Esporte

Arquivo : fevereiro 2014

Paulo André na China? Nem o Marin teria essa ideia!
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Erich Beting

Paulo André foi negociado com o futebol chinês. Era umas 7h da manhã desta quarta-feira quando li nas redes sociais a chamada para a reportagem do Lance! sobre a negociação do zagueiro do Corinthians. Achei que fosse ainda efeito do sono interrompido pelo despertador. Lavei o rosto, voltei para o celular e a confirmação estava lá. Realmente o Paulo André decidiu embarcar para a China.

A decisão é única e exclusivamente dele. Mas não dá para imaginar que não seja parte de um grande projeto arquitetado por José Maria Marin, o presidente da CBF. Claro! Só pode ser isso. Se bem que, analisando os dois anos de gestão Marin à frente da entidade, é bem possível que ele não conseguisse bolar um plano tão mirabolante assim…

Mas, enfim, Paulo André vai para a China. E talvez leve com ele a lufada de esperança que havia de que o artista decidisse elevar o nível do show aqui do futebol no Brasil. Sim, por mais que o Bom Senso tente dizer que ainda vive, essa ida de Paulo André para o outro lado do mundo representa praticamente um tiro de canhão que atinge o comandante da batalha. Ainda não perdemos a guerra, mas ela ficou muito mais difícil de ser vencida depois dessa.

O posicionamento de Paulo André além das quatro linhas talvez seja muito melhor do que aquele dentro do gramado. E isso fazia dele o grande articulador do Bom Senso FC, nome mais do que acertado que foi dado para o movimento de jogadores que querem exigir do futebol no Brasil melhores condições de trabalho e, mais do que isso, a elevação do esporte para um patamar superior. Em qualidade de espetáculo para todos. Atletas, técnicos, dirigentes, mídia, torcedores e, na ponta final disso, patrocinadores.

Paulo André foi o primeiro jogador que peitou o presidente da Confederação Brasileira de Futebol num debate público. Fez isso não para ganhar moral, mas por acreditar que é possível fazer melhor do que a mediocridade (e atenção ao significado do termo, por favor) que impera nos dias de hoje no futebol.

Esse arranca-rabo foi o grande ponto de ruptura do Bom Senso com a CBF. Rompimento que gerou mais mobilização entre os atletas, mas que não conseguiu dar a eles a força necessária para irem adiante. Paulo André seguiu suas convicções e, naturalmente, virou o líder de um movimento que aparentemente não teria líder. Manteve o discurso contundente sobre o que não concordava, deu a cara a tapa, literalmente.

Ele era o capitão do time que tem hoje a maior exposição na mídia no Brasil. Isso dava ao Bom Senso uma força maior do que teria. E a Paulo André um peso a mais para ser carregado nos ombros. A má performance corintiana dentro de campo foi aos poucos sendo personificada no zagueiro e capitão. Os erros do jogador foram colocados na conta da articulação política do Bom Senso, nas atividades além-campo dele (pintura e leitura, entre outros hobbies). Não tinha sentido dizer apenas que ele estava mal. Assim como esteve o time do Corinthians nos últimos 8 meses, pelo menos. Assim como Paulo André nunca foi brilhante com a bola nos pés.

Naturalmente o pavio de PA não aguentou. E ele decidiu ir para a China!

Para o futebol brasileiro mudar, não basta idealismo. É preciso sugerir alternativas. É preciso articular pessoas que também pensem como a gente. É preciso buscar formas de dar ao talento condições ideais para eles brotarem e permanecerem no país. É preciso ação. É preciso peitar o status quo. É preciso ser mais Paulo André e menos Zé Mané.

Resta saber quem será o novo Paulo André do Bom Senso. Porque, para o movimento pegar, é preciso alguém para liderar. Do contrário, nunca a CBF teve tantos motivos para comemorar um reforço do futebol chinês como agora…

Paulo André diz que Bom Senso se fortalece com sua ida para China
Corinthians prevê economia de R$ 2,3 mi com saída de Paulo André


Com Brasil, Fifa assiste a “estreia” do varejo na Copa
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Erich Beting

A realização da Copa do Mundo no Brasil fez com que a Fifa se deparasse, entre outras coisas, com uma espécie de estreia do segmento do varejo na relação com o Mundial. Com uma forte cultura de alto investimento varejista no mercado publicitário e, consequentemente, esportivo, o Brasil fez com que isso se transportasse para a Copa.

No ano passado a Centauro se tornou a primeira empresa do varejo a patrocinar a Fifa. Agora, a novidade está por conta da Garoto, que lançará nesta terça-feira uma réplica da taça da Copa em chocolate. É a primeira vez que um patrocinador cria um produto de bem de consumo relacionado ao Mundial.

A situação reflete, claramente, uma especificidade do mercado brasileiro que reflete no comportamento da própria indústria do esporte. Por aqui, patrocínio esportivo raramente é visto como plataforma para construção de marca. O “benefício” enxergado, quase sempre, é comercial. Ou seja: ao investir no esporte, a conta feita é qual o impacto que isso terá nas vendas.

Isso cria uma situação única para o país. Temos muitas empresas de varejo investindo em esporte, enquanto marcas grandes preferem ir para a televisão em busca de uma campanha que tenha impacto institucional, como bem mostrou no ano passado a Friboi, que fez o público “comum” questionar a procedência da carne comprada no mercado.

Essa é uma realidade que vem praticamente desde o primeiro Valisére, quando a publicidade institucional teve um resultado jamais visto no país. Desde então, com a força da Globo como emissora de maior alcance no país, virou absolutamente comum para as marcas investirem numa campanha maciça para a TV quando querem ser lembradas.

O ponto é que, com a fragmentação da mídia e o aumento das opções de lazer, deixamos de ser tão impactados pela TV como antes. Os shares da audiência continuam a dar para a Globo uma liderança folgada. Mas a quantidade de aparelhos ligados é cada vez menor.

A exceção é, exatamente, o evento ao vivo. Quando o evento é bom, as pessoas tendem a querer ficar ligadas para acompanhá-lo em tempo real. Isso assegura à TV altos índices de audiência e às empresas que a ele se associam grandes resultados institucionais.

O problema que faz com que, aqui, esse cenário ainda não esteja bem desenhado é que os eventos geralmente são de baixa qualidade. Mas os “últimos capítulos” das novelas mostram a cada ano o quão valioso é o bom conteúdo inédito para engajamento de marcas.

A Copa do Mundo no Brasil, porém, é o evento perfeito para que essa equação mude na cabeça das empresas na hora de planejar um investimento no esporte. Mesmo assim, ainda encontramos marcas que repetem a velha fórmula de sempre. É só ver como a maior parte dos patrocinadores foi para a mídia agora anunciando ações de “compre e ganhe” relacionada a ingressos. É a síntese do pensamento varejista no patrocínio. Algo para o qual a Fifa simplesmente não estava acostumada.


Espanha tenta solucionar problema que ela mesma criou
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Erich Beting

O governo espanhol decidiu intervir e assegurar uma divisão menos desigual da receita de televisão dentro do futebol do país. A medida faz parte de um trabalho da liga espanhola para tentar frear a hegemonia de Real Madrid e Barcelona na geração de receitas e que se estende para o resultado dentro de campo (detalhes podem ser lidos aqui).

O fato é que a Espanha tenta solucionar, agora, um problema que ela mesma criou há cerca de 20 anos. Quando o governo espanhol fez vistas grossas para a divisão de receitas dentro do país e estimulou as soberanias de Real e Barça, criou o problema que agora está mais do que claro dentro do futebol espanhol.

Pesquisas feitas no país mostram que o espanhol sente orgulho em ver uma equipe do país ser chamada de “melhor do mundo”. Mesmo no cenário de rivalidade extrema como Real Madrid e Barcelona, é bom para a autoestima da Espanha ter um time encabeçando a lista dos melhores. Foi a partir disso que o país passou a desenvolver projetos para ter atletas e equipes dominantes em diversas modalidades.

Em tempos de crise, esse é um eficiente anestésico para a população. A Espanha do desemprego a 25% (4,8 milhões de pessoas) é também a Espanha campeã do mundo e da Europa no futebol, de Rafael Nadal e Fernando Alonso, de Barcelona e Real Madrid, do basquete bom de cesta, etc. É contraditório, e tem de ser mesmo. Afinal, o que o governo espanhol fez foi investir e permitir que o esporte criasse seus grandes líderes mundiais, nem que para isso fosse preciso sufocar a geração de mais ídolos e equipes competitivas.

Só que agora essa conta chegou. O interesse pelo futebol espanhol passou a ser o interesse por Barcelona e Real Madrid. Campeões de 9 dos últimos 12 campeonatos nacionais, eles criaram um enorme problema. Não há perspectiva, no médio prazo, de que a bipolaridade vá se encerrar. Este ano, por milagre e investidores estrangeiros, o Atlético de Madri conseguiu entrar provisoriamente na dança e briga pelo título. Até quando é a pergunta que sempre se faz.

Com o futebol mais bem organizado, naturalmente a lógica da bola vira automaticamente a lógica da grana. Pode mais quem tem mais dinheiro em caixa. Há 15 anos, quando os clubes ainda tinham uma gestão semiprofissional, esse cenário era mascarado. Hoje, com Barça e Real gerenciados de forma profissional, fica impossível competir em nível de igualdade. Equilibrar a diferença da televisão é o primeiro passo para tentar modificar essa realidade.

No futebol brasileiro, durante 20 anos de Clube dos 13, a arrecadação de TV, que é a maior fatia do bolo de receita do futebol no mundo, teve uma divisão mais justa entre os participantes. Desde que o C13 foi implodido, essa divisão passou a ser menos igualitária. Ainda temos o ambiente semiprofissional imperando dentro do futebol tupiniquim.

Será que daqui a 15 anos precisaremos baixar uma lei para tentar deixar a divisão de receitas mais justa e o futebol mais atrativo para o mercado brasileiro? Essa análise de cenário que foi inteligentemente sufocada por Corinthians e Flamengo na ruptura do C13 em 2010 precisa voltar urgentemente à pauta.

Mesmo num cenário muito difícil de hegemonia de apenas dois clubes, até por conta da extensão territorial do país, é natural que, com a maior receita sendo dividida de forma mais desigual, tenhamos pelo menos quatro diferentes tipos de disputas dentro do Campeonato Brasileiro. A do título, a da vaga na Libertadores, o bloco intermediário e os eternos “gangorras”. Isso, para o futuro do esporte, é o pior cenário possível.

Só não ver quem não quer. Ou quem não estuda.


Corinthians prepara “invasão do bem” ao CT
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Erich Beting

O Corinthians encontrou uma maneira divertida de virar o jogo a seu favor após a crise instaurada pela invasão ao Centro de Treinamento do clube no sábado passado. O departamento de marketing do clube preparou uma “invasão do bem” ao CT na tarde desta sexta-feira. Dois ônibus com cerca de 70 crianças estão neste instante na porta do CT Joaquim Grava para “invadir” o local. Isso deve acontecer em até meia hora.

Cada uma das crianças entregará uma flor branca, simbolizando a paz, a jogadores e funcionários do Corinthians presentes no CT. Desde as 16h, o perfil do clube no Twitter tem enviado mensagens alusivas à ação.

A ideia, com a iniciativa, é dar, literalmente, um tapa com as flores na violência do torcedor que na semana passada decidiu protestar contra a má performance da equipe dentro de campo invadindo o CT e ameaçando os atletas. A selvageria dos torcedores acelerou algumas saídas de jogadores do clube, como Alexandre Pato e Douglas, recentemente negociados.

A “invasão do bem” foi planejada esta semana, e tem como objetivo resgatar o sentimento de amor do torcedor pelo clube. Além disso, a diretoria corintiana acredita que, ao demonstrar carinho aos jogadores, consiga dar mais energia a eles para virar o jogo dentro de campo e ajudar o clube, que perdeu os últimos quatro jogos.

No fim das contas, é muito mais eficiente do que ir para a greve. E vai, com certeza, sensibilizar muito mais as pessoas no meio da selvageria que insiste em rodear o futebol brasileiro…

Meninos aguardam para entrar no CT corintiano

Meninos aguardam para entrar no CT corintiano

 

Jogadores e torcedores trocam bola dentro de campo

Jogadores e torcedores trocam bola dentro de campo após a “invasão”

 

Torcedores ao lado dos jogadores, já com a rosa na mão

Torcedores ao lado dos jogadores, já com a rosa na mão


A democracia da arquibancada deu um show no Pacaembu
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Erich Beting

A arquibancada é o espaço mais democrático que existe. Essa é uma máxima imortalizada pelo futebol já de muito tempo, na era Rodriguiana, quando Nelson Rodrigues cunhou algumas expressões fundamentais para o desenvolvimento da cultura futebolística brasileira.

Mas se tem uma “máxima” que se tornou “mínima” nos últimos anos foi essa. A democracia da arquibancada deixou de existir a partir do momento em que foram se formando grupos representativos de alguns perfis de pessoas dentro de um estádio. Organizados sob o prisma da “torcida organizada”, esses grupos foram, aos poucos, tolhendo a liberdade de livre expressão numa arquibancada.

Primeiro foi o direito de torcer pelo adversário. Foi a partir da união do torcedor em grupos que os torcedores tiveram de ser, a exemplo de animais incontroláveis, separados dentro do espaço físico de um estádio.

Depois, passou a ser o direito de torcer cada um a sua maneira, mesmo que fosse pelo mesmo time!

Ir a uma arquibancada e dividir o mesmo habitat de uma torcida organizada significa, necessariamente, ter de obedecer às regras desse grupo. Você tem de cantar aquele determinado hino naquela determinada hora. É preciso “seguir a corrente”, mesmo que para isso você tenha de ir contra algum de seus princípios. E a regra, seja na Rua Javari ou na Fonte Nova, é sempre a mesma. Siga a voz de comando da “organizada” e vai com a turma.

Isso é bonito para o espetáculo. Permite que tenhamos música, festa, incentivo. Faz de um estádio de futebol uma alma pulsante. Mas a realidade é essa. Não é uma democracia. É a ditadura, quase sempre à força, de ir com a “torcida”.

Só que a democracia voltou a vencer na noite da última quarta-feira, no estádio do Pacaembu. O torcedor “comum” não quis seguir a torcida “organizada”, que pedia para não incentivar o time. O registro feito pela Globo do comportamento dos torcedores é um daqueles trabalhos jornalísticos de dar gosto. Captou onde estava a notícia dentro do modorrento Corinthians 0x2 Bragantino. Registrou exatamente onde está a tensão dentro da torcida alvinegra (veja aqui).

O conflito de ontem no Pacaembu mostrou que a democracia pode superar a ditadura, mesmo dentro de um estádio em que a força opressora da organizada é quase sempre maior que a paixão do torcedor comum pelo clube.

O torcedor que invade o centro de treinamento para cobrar os atletas não tem legitimidade para falar em nome de milhões. Da mesma forma que, não necessariamente, representa os milhares de uma torcida organizada. Mas uma coisa é certa. O espaço de uma arquibancada tem de ser democrático. A resposta dada ontem pelos corintianos é um sinal de alerta para as torcidas organizadas.

Cada dia que passa, a legitimidade dos “organizados” para falar em nome da torcida de um clube é menor. Estrategicamente, os clubes precisariam perceber isso para virar o jogo em seu favor. É o melhor jeito de, sem brigas, acabar com algo que, se no passado ajudava a promover o espetáculo, hoje é em parte responsável pela baixa atratividade dele.

Afinal, a conexão do clube com o seu torcedor não precisa de intermediários.


Santos e Corinthians provam que esporte supera o marketing
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Erich Beting

Uma das máximas inabaláveis do marketing esportivo é a de que, quando é preciso pesar os prós e os contras de um bom projeto, tem de se dar um peso maior para o respeito à performance esportiva em detrimento de uma grande ideia. Basicamente o grande segredo de uma boa sacada no marketing esportivo é a de que o esporte sempre terá de superar o marketing.

Dois exemplos recentes, um positivo e outro negativo, provam exatamente isso.

O Santos lançou, no dia 28 de janeiro, uma promoção com o site Palpiteros. A ideia era fazer um bolão para que o torcedor adivinhasse quem seria o autor do gol de número 12.000 da história do clube. Nas contas do clube e do site, durante pelo menos um mês a promoção estaria em vigor, aumentando o relacionamento de ambos com os consumidores (leia aqui). A campanha envolveu até a instalação de um relógio com contagem regressiva para o feito.

Em dois jogos, porém, o Peixe marcou dez gols e, assim, encurtou o projeto, que teve duração de apenas uma semana. Nesse caso, a boa ideia de marketing foi “atropelada” pela performance esportiva muito boa do time. Santos e Palpiteros, muito provavelmente, terão de pensar numa nova estratégia para atrair de novo o torcedor e, assim, conseguir atingir o número de pessoas planejado, já que em uma semana o time atingiu a meta de gols prevista para cerca de um mês.

Já o Corinthians apresentou, na última terça-feira, o novo modelo de terceiro uniforme do clube. Ao lado de Bahia, Coritiba, Internacional e Santos, o Timão usará a cor amarela na terceira camisa, seguindo estratégia adotada pela Nike de vestir os seus clubes patrocinados com a mesma cor da camisa principal da seleção brasileira (leia aqui).

A apresentação da camisa seguiu um planejamento anual da fabricante americana. Até aí, nenhuma novidade. O problema foi que, nas redes sociais, o clube decidiu promover a pré-venda do uniforme. No momento de maior crise na história entre o time de futebol e sua torcida, a ação teve efeito imediato. Com a equipe mal em campo, diversos comentários sobre o lançamento do novo uniforme pediam para, entre as análises publicáveis, que o time deixasse de amarelar nos jogos…

A afobação do gestor das redes sociais do Corinthians em promover o produto superou a cautela que deveria ter sido tomada. Era melhor esperar a poeira baixar, os resultados aparecerem e, aí, entrar com tudo na promoção da camisa. A estratégia de marketing seguia o curso normal, mas não poderia nunca ter entrado em ação por conta do momento do time dentro de campo.

Da mesma forma que o Santos teve de entender que a estratégia foi abreviada por conta da boa performance esportiva, o Corinthians precisava entender que a estratégia teria de ser adiada por conta da má performance esportiva. Os dois casos provam que para um projeto de marketing esportivo atingir o máximo de potencial possível, o esporte, sempre, terá de prevalecer sobre o marketing.


O Brasil hoje é a Inglaterra de 25 anos atrás
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Erich Beting

Estádios obsoletos. Violência dentro e fora dos campos. Baixo nível técnico das partidas. Insegurança para quem trabalha com isso. O aparente retrocesso do futebol brasileiro nos dias de hoje tem uma pequena luz no fim do túnel. Somos, atualmente, o que era o futebol na Inglaterra há 25 anos, ou um pouco, mas bem pouco, mais do que isso.

A realidade inglesa do fim dos anos 80, começo dos 90, era tenebrosa. Nos estádios, bandidos travestidos de torcedores tocavam o terror na arquibancada e pressionavam os jogadores por resultados dentro de campo. Nos clubes, havia pouco preparo entre os gestores para conseguir racionalizar os gastos e montar um futebol competitivo. Os gramados eram feios, o futebol dentro dele idem, a seleção inglesa tinha algum lampejo de bom futebol por alguns talentos naturais que brotavam, como Lineaker e Gascoine.

Não havia um sentimento de debate único dentro do futebol inglês. Cada um olhava para o seu problema e tentava seguir adiante. Proibidos de atuarem pelas ligas europeias, os clubes do país não despertavam o interesse dos jogadores e da mídia estrangeiros. O país que inventou o futebol era, naquela ocasião, uma espécie de túmulo do esporte.

Até que veio a decisão, do governo, de reorganizar a modalidade. O famoso Taylor Report, de janeiro de 1990, foi o primeiro divisor de águas. A partir dele, os ingleses exigiram padrões mínimos para os estádios, regras de comportamento dentro deles e, mais importante, mecanismos de punição (e cumprimento das penas) aos maus torcedores.

Isso tudo gerou o início de um movimento de melhorias dentro do futebol da Inglaterra. Quem largou na frente foi o Manchester United, que profissionalizou completamente a gestão do clube em 1992. Na mesma época, não por acaso, os clubes perceberam que, juntos, poderiam obter melhores contratos do que em negociações separadas. Foi a criação da Premier League, a primeira divisão, baseada naquilo que havia nas ligas esportivas americanas e que se adaptava para a realidade do futebol.

Hoje, após 20 anos desse início de movimento, a Inglaterra tem o melhor campeonato de futebol do mundo. É o mais competitivo, o com maior movimentação de receita, maior venda de direitos de transmissão, melhores gramados, melhores jogadores, etc. Tudo isso conquistado após o futebol inglês chegar ao fundo do poço. Nenhum outro torneio na Europa é tão disputado quanto na Inglaterra.

Logicamente isso só é possível de acontecer hoje pela mudança de comportamento em toda a cadeia produtiva do futebol inglês. Mudança que apresenta muitos erros, logicamente (como os donos mais do que suspeitos de muitos clubes), mas que ainda assim chegou ao melhor patamar de competitividade e promoção do evento no futebol mundial.

A cada novo episódio que acontece dentro do combalido futebol brasileiro, fica claro que o fundo do poço se aproxima.

O último movimento mais rígido do governo para tentar melhorar as coisas via lei, como na Inglaterra, foi em 2002, quando foi gerido o Estatuto do Torcedor, que virou lei no ano seguinte, no primeiro ato do governo Lula. Na ocasião, a resposta dada pelos clubes foi a ameaça de paralisar o futebol em maio, quando começava o Campeonato Brasileiro.

Estavam à frente do movimento Eurico Miranda, Ricardo Teixeira, Fábio Koff, Mustafá Contursi, entre outros. Há dez anos, eles eram a liderança do futebol no país. Hoje, dos quatro, apenas Teixeira, que brigou com Joseph Blatter, deixou de ser figura influente dentro do futebol. Eurico volta com força ao Vasco, Koff preside o Grêmio, Contursi segue ativo nos bastidores do Palmeiras.

Como se vê, o futebol brasileiro segue com muitas caras e mentalidades do passado no presente. Isso tem uma relação direta com o que acontece hoje dentro do esporte, em que a truculência é regra. Seja na invasão de um centro de treinamento, seja na pergunta e na resposta de uma entrevista coletiva para a imprensa, seja na maneira como se aceita a derrota ou se comemora a vitória.

O lado positivo de tudo isso é que é possível achar um caminho para sair dessa aparente areia movediça em que se meteu o futebol do Brasil. Mas, para isso, é preciso uma radical mudança de atitude. Que pode, muito bem, começar com uma paralisação, mais do que legítima, daquele que é o principal responsável por fazer o futebol ser um grande barato, que é o jogador.

Sem matéria-prima não há produto. E esse parece ser o único caminho, agora, para fazer com que o Brasil volte para os anos 90 e passe a agir como os ingleses. Mas, dessa vez, aprendendo com os erros lá cometidos para fazer aquilo que não é impossível, embora pareça, que é construir um dos melhores campeonatos de futebol do mundo. Consumidores ávidos para isso existe. É preciso, porém, despertá-los.


A principal aula do Super Bowl
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Erich Beting

, Esqueça o valor do comercial de 30s na televisão. Isso não é, nem de perto, o grande segredo do Super Bowl. Mesmo com a cifra recorde de US$ 4 milhões pelo tempo mínimo de publicidade na TV, a grande final do futebol americano é uma aula em tempo real de como deve ser tratado o esporte para, assim, ser capaz de gerar o segundo mais valioso da publicidade mundial.

Para começar, engana-se quem pensa que a TV fatura horrores com essa publicidade. Porque a conta dela para transmitir o evento é muito mais salgada. A Fox, que foi quem exibiu a decisão deste ano, amealhou cerca de US$ 360 milhões com os comerciais. Para ter os direitos de transmitir a temporada da divisão da NFC e ter a exclusividade sobre o Super Bowl, porém, a emissora desembolsou três vezes mais do que isso: US$ 1,1 bilhão.

O sistema de venda de direitos de transmissão da NFL é, aliás, a primeira aula a ser dada para o mercado pelos americanos. Os direitos pertencem exclusivamente à liga. Não é dos clubes, mas do campeonato. A liga é responsável por produzir todas as imagens dos jogos. As emissoras de TV são meros reprodutores dessas imagens. Elas são, assim, o meio de propagação do futebol americano, e não o fim.

Esse modelo, que é usado pelos principais campeonatos do mundo, permite à NFL duas coisas fundamentais para a promoção de seu torneio. A primeira é ter controle sobre o conteúdo levado ao torcedor, valorizando o evento do qual ela é dona. A segunda, e fundamental, é endurecer a negociação com as emissoras de TV, tornando-se menos dependente delas e lucrando mais nas negociações.

Só para se ter uma ideia, a NFL tem seis diferentes emissoras transmitindo seus jogos para o mercado americano. Isso sem falar nas redes locais e na própria rede própria da NFL, que desde 2006 exibe uma partida às quintas-feiras. A venda dos direitos para emissoras distintas, além de dar mais opção ao consumidor, engorda os cofres da liga. São cerca de US$ 5 bilhões de receita ao ano apenas com os direitos de transmissão. Todo esse dinheiro, aliás, dividido igualmente entre os clubes da liga, com o intuito de manter ao máximo o nível competitivo dos clubes por meio da maior equidade financeira possível.

O valor pago por essas emissoras dá a elas alguns direitos, mas um deles não lhe compete, que é gerar as imagens das partidas. Isso é uma propriedade exclusiva da TV da liga, que dessa forma faz com que a entrega dada aos patrocinadores do evento seja limpa e cristalina (e que permite a ela aumentar o valor cobrado por esse patrocínio). O resultado pode ser visto no último domingo, quando a transmissão aqui no Brasil exibia, a cada espaço de tempo, o MetLife Stadium em sua totalidade, dando clara entrega comercial para o detentor do naming right do estádio. Isso sem falar nas exibições das placas de publicidade dentro do próprio estádio e diversas outras imagens que faziam parte de um acordo que ia além da transmissão jornalística do evento.

Por aqui, a NFL pode ser comparada ao futebol, pela força de mídia, público e atração de patrocínio. Nem mesmo a venda de direitos de transmissão dos eventos no Brasil é feita coletivamente. Desse jeito, é impossível pensar que, algum dia, chegaremos a produzir algo próximo do Super Bowl. Pelo menos pela próxima década…


Federação, ainda vai ficar só na bandeira?
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Erich Beting

A iniciativa foi interessante. No Paulistão Chevrolet, todos os jogos terão bandeiras brancas sendo usadas pelos auxiliares do árbitro. O projeto, chamado de “Para a paz, não há impedimento”, tenta sensibilizar o torcedor para que haja menos violência dentro de campo.

Aí vem o primeiro clássico do Paulistão, a primeira goleada e o mundo cai. No sábado, o Centro de Treinamento do Corinthians é invadido, jogadores são agredidos moral, verbal e fisicamente. Os atletas se reúnem e passam a debater se entram ou não em campo no final de semana. A diretoria corintiana pede cancelamento da rodada.

Chega a noite, os times entram em campo. No domingo, o que ainda resta do time do Corinthians enfrenta a Ponte Preta, outra equipe que foi ameaçada pelos torcedores.

Mas e aí, cadê a tal da bandeira pela paz? Em campo, os auxiliares dos árbitros seguem com o instrumento levantando a bandeira pela paz. Mas e fora dele, o que faz a entidade que organiza o campeonato atingido diretamente pela barbárie?

Pois é, a iniciativa parece ter ficado só na bandeira…

A situação está atingindo o nível do insustentável, para dizer que o copo já não transbordou há tempos.

A bandeira pela paz parecia uma boa iniciativa. Quando ela fica apenas na iniciativa, de nada adianta. Até quando a Federação Paulista de Futebol vai ficar só no discurso, sem fazer nada que realmente mude a cara do futebol do qual ela depende para existir?