Negócios do Esporte

Arquivo : julho 2014

A falta que faz a união dos clubes
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Erich Beting

Quando, motivados por um aumento substancial no dinheiro recebido da televisão, os clubes decidiram acabar com o Clube dos 13, lá em 2010, eles regrediram alguns bons anos na gestão comercial do Campeonato Brasileiro.

Não que o C13 fosse uma entidade que representasse bem os clubes. Mas, com erros e acertos, a instituição era um ponto único de negociação coletiva para os clubes no Brasil.

O fim de uma entidade representativa de classe significou o fim de qualquer possibilidade de se facilitar a negociação de acordos comerciais coletivos para o futebol no Brasil.

O problema entre a EA Sports e os clubes para ter os times brasileiros na versão do Fifa 15 é mais uma prova de como pode ser maléfico o fim das negociações em conjunto dos clubes.

Na lógica do negócio da EA, foi mais simples deixar de ter os clubes do Brasil do que ter de sentar e, um a um, renegociar todos os contratos. A avaliação é de que é mais simples ter de abrir mão dos times locais do que perder tempo e dinheiro renegociando os acordos previamente firmados.

A questão que envolve os games não é financeira. Com o calendário inchado e desconexo da Europa, os jogos são uma forma de levar a marca dos times para o exterior. Ao não ter os brasileiros no game oficial da Fifa, a perda dos clubes é significativa.

A Europa ensina há décadas que viver só do dinheiro da TV é um risco. E o futebol no Brasil parece que só tem olhos para essa fonte de receita. Enquanto não houver um trabalho para fazer com que os clubes voltem a ter alguém que os represente de forma única, será cada vez mais raro uma empresa querer fechar um projeto conjunto envolvendo o futebol no Brasil.

Os dirigentes continuam com a mentalidade tacanha de achar que os clubes são rivais entre si também fora de campo, quando a lógica deveria ser completamente oposta. Para ganhar maiores margens financeiras e conseguir ampliar o alcance de suas marcas, os clubes precisariam, urgentemente, voltar a pensar coletivamente.

Parece que só no futebol os principais executivos não acreditam que, às vezes, a união é o melhor para os negócios…


O patrocínio não precisa servir só para o público final
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Erich Beting

Parece batido, mas muitas empresas ainda têm dificuldade em entender que o patrocínio não pode ser visto como algo eficiente apenas para o público final, que é teoricamente o consumidor da marca.

Nesta semana, o Bradesco deu uma demonstração de que pode ser muito útil para a empresa usar a propriedade que é patrocinada para trabalhar o público interno.

Na terça, os jogadores da seleção masculina de basquete estiveram presentes na sede do banco, em Osasco (SP), para realizar um treino no ginásio existente lá. A atividade foi acompanhada pelos alunos dos projetos sociais envolvendo o basquete que a instituição mantém. E, depois disso, os jogadores foram conversar com executivos e funcionários do Bradesco.

A ação, que durou o período de um dia, ajudou a reforçar o investimento que a empresa faz no esporte ao mesmo tempo que levou para os alunos dos projetos sociais a figura do ídolo. Internamente, a presença dos atletas de seleção fazem o funcionário se engajar mais com o patrocínio feito pelo banco. Ao ter contato com o jogador, começam a acompanhar mais o esporte.

Uma das funções primordiais do patrocinador é ajudar a promover a entidade que patrocina. No cenário da Copa do Mundo, vimos isso com bastante clareza. Os patrocinadores se esforçaram para elevar o interesse das pessoas no evento e, na ponta final, melhorar a relação com os consumidores e também com o público interno, que são os funcionários.

O patrocínio esportivo vai muito além da exposição da marca. Em dois anos, vamos ver uma nova realidade invadir o esporte, com as ações dos patrocinadores das Olimpíadas, evento em que não há nenhuma marca exposta a não ser os aros olímpicos. Até lá, dá para se trabalhar bastante para não restringir o patrocínio à exposição. Aprendemos muito pouco com a Copa do Mundo.

O exemplo do Bradesco mostra que as marcas podem ter diversos benefícios ao investir em esporte. Se for buscar apenas a medição de horas de exposição na TV, a relação custo-benefício será cada vez menor.

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Atletas da seleção masculina de basquete durante a visita ao prédio do Bradesco


A encruzilhada dos pontos corridos no Brasil
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Erich Beting

O futebol brasileiro completa, neste ano, a 11ª edição de seu maior campeonato no formato dos pontos corridos. Medida tomada à força do Estatuto do Torcedor em 2003, o Brasileirão por pontos corridos chega, agora, a uma encruzilhada.

Os pontos corridos são, sem dúvida, o sistema mais justo para definir o campeão. Além disso, permitem as melhores condições de planejamento para as equipes na temporada e, também, aumentam a arrecadação com TV e patrocínio pela maior quantidade de jogos disputados.

Só que, por outro lado, a decadência técnica do futebol está fazendo com que os pontos corridos matem aquilo que há de mais imprescindível dentro da cadeia do esporte, que é a paixão acesa do torcedor.

Sem bom nível técnico dentro de campo, o torcedor menos fanático começa a se distanciar do futebol. Ainda mais quando o campeonato é mais arrastado e os clubes, emissoras e dirigentes pouco fazem para criar motivos para o torcedor querer consumir os jogos.

O reflexo dessa situação está na estagnação da audiência na TV e, também, na procura baixa pela ida aos estádios. Hoje, o futebol está praticamente restrito ao torcedor fanático. Só quem é apaixonado por ele continua a acompanhar e consumir. O torcedor menos fanático, que é a maioria, fica cada vez mais distante.

Num cenário em que o Brasileirão tem 38 rodadas e menos imprevistos, fica ainda mais difícil chamar a atenção de quem divide o tempo livre com diversas outras atividades além do futebol. Tanto que a audiência de Corinthians x Palmeiras do último domingo foi menor que a do clássico durante o Campeonato Paulista deste ano, quando havia a chance de um dos times ser eliminado da competição graças ao formato de disputa previsto.

Hoje, o retorno à fórmula do “mata-mata” pode ser uma alternativa para atrair mais público para o futebol no curto prazo. Esportivamente a medida é condenável, já que não deixa mais justa a disputa pelo título. Mas, estrategicamente, é uma solução para atrair um tipo de torcedor que se distanciou do futebol por não ter nele tanto interesse.

Outro caminho, esse de longo prazo, é melhorar a qualidade do espetáculo, reduzir a dependência da televisão, diversificar as fontes de receita dos clubes e trabalhar para que se dependa cada vez menos do atual ciclo vicioso que dominou a gestão no país.

Um dos maiores diferenciais do esporte em relação às demais formas de entretenimento é justamente a sua imprevisibilidade. No atual cenário do futebol nacional, a solução para isso, no curto prazo, é tornar o Brasileirão um torneio mais atraente para o público.

Os pontos corridos, hoje, infelizmente estão numa encruzilhada…


Copa prova que Brasil não sabe faturar com estádio
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Erich Beting

É alarmante, para dizer o mínimo, o resultado apresentado pela Visa com os números relativos às transações financeiras que aconteceram dentro dos estádios na Copa do Mundo. A preocupação não é tanto com o consumo de R$ 30 milhões apenas com os meios de pagamento da empresa de cartões, mas com o quanto isso deixa evidente que o futebol no Brasil não sabe explorar seu produto (detalhes podem ser vistos aqui).

 

Numa conta rápida, já que não se tem os detalhes do faturamento da venda em dinheiro, dá para crer que cada jogo da Copa movimentou cerca de R$ 1 milhão só com a venda de bebidas, comida e produtos licenciados. Um estádio da Fifa não traz praticamente nada de diferente para que o consumidor deixe muito dinheiro nele. No máximo as lojas oficiais são os pontos de venda mais concorridos. Imagine se houvesse outros pontos de interesse para a pessoa gastar?

Os estádios precisam, cada dia mais, serem vistos como centros de consumo. Devem ser planejados para abrigar um número significativo de lojas e opções de alimentação para as pessoas. A experiência do torcedor precisa ser feita para que ele chegue com pelo menos três horas de antecedência e sair duas horas depois da partida (logicamente nos jogos de fim de semana, quando há mais tempo para isso).

Ao fazer isso, além de ter menos transtornos com o deslocamento da torcida, há muito mais opção de geração de receita para os gestores dos estádios. Se a Fifa, mesmo sem grande esforço, conseguiu faturar quase R$ 1 milhão em vendas por jogo da Copa, o que dirá dos clubes de futebol no Brasil, que podem explorar semanalmente essa fonte de receita e, mais do que isso, criar motivos para que o torcedor queira consumir ainda mais?

Três dias depois do término da Copa do Mundo, alguns dos estádios que estiveram no Mundial receberam partidas do Campeonato Brasileiro. Nem mesmo os quiosques de alimentação estavam presentes na área que foi criada pela Fifa para ser o ponto de encontro – e consumo – dos fãs.

Os clubes no Brasil ainda acham que a bilheteria é a receita primária de um estádio, sem perceber que o melhor é enchê-lo de gente. E, então, faturar. Enquanto os dirigentes ainda querem se vangloriar de quem ganha mais com a venda de ingressos, muito mais inteligente seria debater quanto cada torcedor deixou de seu dinheiro no dia de jogo.

Só com ações desse gênero será possível reduzir a dependência de fontes como patrocínio e televisão no futebol. O potencial, ficou claro, existe.

Em tempo. Para quem acha que os números altos da Fifa são por conta do torcedor estrangeiro, o consumidor brasileiro foi responsável por gastar R$ 19 milhões desses R$ 29 mi nos estádios. Dinheiro para ser gasto existe. Falta ter motivo para isso.


CBF deverá escolher a dedo o diretor de comunicação
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Erich Beting

Uma das coisas que espero que Dunga tenha aprendido na primeira passagem como técnico da seleção brasileira é a importância de se tentar manter um cordial relacionamento com a imprensa. No BBB institucionalizado desde sempre no time nacional, tão importante quanto criar padrão de jogo e dar condições para que os jogadores evoluam está a necessidade de manter a mídia em sintonia contigo.

A volta dele após quatro anos à seleção brasileira pode dar certo. Mas passa, essencialmente, por uma nova forma de Dunga se relacionar com a imprensa. Por que isso se reflete, diretamente, na forma como a opinião pública vai encará-lo durante o período à frente da seleção.

Esse, hoje, é o maior desafio dele como treinador. A base da equipe está montada, é muito melhor do que a geração que ele formou em 2010 e ainda tem a experiência de fracassar numa Copa em casa, algo que ajuda a criar mais elementos de superação para motivar os atletas e a comissão técnica nesse trabalho.

Mas, se não houver um trabalho pesado de “media training” com Dunga, tudo isso pode virar pó na primeira derrota mais aguda. Só de acompanhar, pelo Twitter, os comentários dos jornalistas sobre as respostas do treinador, já deu para sentir que o rancor da mídia permanece aflorado.

Não temos, no Brasil, a cultura de pensar em médio e longo prazo e, muito menos, de sermos permissivos a uma segunda chance. Dunga pode ter mudado, evoluído e aprendido a ser mais maleável com a imprensa. Da mesma forma que a imprensa pode também ser mais complacente. Isso só vai ser possível notar com o começo dos trabalhos.

Dunga é uma aposta boa da CBF por vários motivos, mas o principal deles é essa atribulada relação do treinador com a mídia. Dunga é filho que não foge à luta, como diz o verso do hino nacional. Assim, ele vira um baita de um escudo para quem está atrás da linha de frente e que deveria ser o principal foco do questionamento.

Esperar uma renovação na CBF é tarefa impossível. Se isso viesse a acontecer, precisaríamos dar mais condições para quem está mais qualificado. E isso implica, necessariamente, em mudar o topo da cadeia (im)produtiva do futebol.

Dunga, quatro anos depois, é a velha solução para os eternos problemas da CBF. Com a experiência da primeira queda, pode ser que dê muito certo. Uma coisa é certa.

Escolher quem será o novo diretor de comunicação da CBF é vital para que o castelo não desabe na próxima Copa…


A Copa do Mundo foi uma realidade paralela no futebol
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Erich Beting

Há uma semana, os olhos do brasileiro estavam voltados para o estádio do Maracanã. Mais de 70 mil pessoas estavam ali, presenciando um belo espetáculo de futebol. Outros milhões grudaram os olhos na tela de TV, computador ou qualquer outro meio de comunicação audiovisual. Assistimos entusiasmados ao fechamento da “Copa das Copas”, ou de pelo menos um dos melhores Mundiais de futebol dos últimos 30 anos.

A consagração da Alemanha, a bravura argentina, de enorme dedicação tática e técnica para tentar frear um time notadamente superior, alguns dos melhores jogadores da atualidade… Teve de tudo um pouco naquele ensolarado fim de tarde no Maraca.

Passada uma semana, o Maracanã ainda não voltou a ter jogo. Mas já tivemos duas (SIM, DUAS) rodadas do Campeonato Brasileiro. E duas notícias entre as várias nesta noite de domingo são:

“Torcidas do Inter entram em conflito e depredam posto de gasolina”.

“André Santos é agredido por torcedores do Flamengo na saída do vestiário”.

A conclusão mais óbvia que se chega é que a Copa do Mundo parece ter representado uma realidade paralela ao nosso futebol. Durante um mês tivemos diversos exemplos de como assistir a uma partida de futebol pode ser um programa para ir com família, amigos, ou até mesmo sozinho. Não é só por uma paixão religiosa que devemos nos locomover a um estádio, mas por ser algo interessante para fazer no momento de lazer.

Poderíamos ter aprendido bastante com o tal do “Padrão Fifa”. Sem levá-lo para o lado oportunista da entidade ou dos anti-Fifa. Afinal, o Padrão Fifa está longe de ser exemplo de como colocar o fã na condição de consumidor e principal ativo a ser trabalhado pelo esporte. Mas, dentro do universo combalido do futebol brasileiro, a exigência  de um nível mais alto no tratamento do fã como consumidor serviria para fazer com que as coisas melhorassem minimamente.

Não é possível que, nem dez dias depois de termos vivenciado 30 dias de um futebol de altíssima qualidade, tenhamos voltado à selvageria plena.

O futebol no Brasil está cada vez mais restrito ao fanático. E isso é um imenso problema para o futuro dessa indústria. Por maior que seja o contingente de fanáticos, eles são muito mais propensos a serem irracionais na relação com essa paixão.

A Copa do Mundo deveria ter servido de exemplo para começarmos a exigir transformações. Mas ela está cada vez mais com cara de que foi uma realidade paralela que invadiu o cotidiano do futebol brasileiro por 30 dias…


O problema não é (só) a seleção
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Erich Beting

Sai Carlos Alberto Parreira e entra Gilmar Rinaldi. Esse é, pretensamente, o início de uma mudança na seleção brasileira de futebol. E é, também, a prova de que podemos trocar os nomes que forem, mas que nada de fato poderá sofrer alteração.

No dia da humilhante derrota brasileira para a Alemanha, escrevi neste espaço que os 7 a 1 poderiam servir para ensinar o futebol do Brasil que é preciso mudança.

Ao ver as primeiras repercussões sobre a mudança de coordenador de seleções da CBF, fica claro que, mais uma vez, boa parte da mídia simplificou o problema e estamos caminhando para não usar o rolo compressor germânico como espécie de “cantinho do castigo” para aprendermos a lição.

O problema não é a seleção brasileira de futebol. Ou melhor. Não é só quem dirige a equipe principal do país ou quem coordena todas as seleções que representam a nação.

O enrosco hoje é o futebol praticado no Brasil.

Quem assistiu aos jogos dos últimos dois dias desta volta garganta abaixo do Brasileirão das Séries A e B vê isso com facilidade. Saiu o futebol coletivo, de velocidade, trocas de passes e algumas jogadas individuais e entrou esse amontoado que costumamos chamar de “futebol brasileiro”.

Não há Gallo, Rinaldi ou Guardiola que resolva isso só trabalhando na esfera da seleção brasileira. Continuar pregando renovação baseado na premissa de que talentos brotam naturalmente nessas terras e que falta só um bom treinador para dirigir o time nacional é ignorar o contexto em que o futebol está inserido nos dias de hoje.

O exemplo alemão, que virou moda agora com o título mundial, não vem da conquista de domingo passado, mas de um trabalho de médio e longo prazo, que começou com a renovação de todo o futebol alemão.

Entenda-se por todo a cadeia inteira do futebol: atletas, treinadores, dirigentes, comissão técnica, patrocinadores, governantes, jornalistas e, por fim, torcedores. São esses, a grosso modo, os componentes da indústria do futebol.

Não é apenas o técnico que precisa se reciclar no Brasil. A mídia, os patrocinadores, os torcedores, todos precisam rever seus conceitos.

– Os jornalistas precisam aprender a ver jogo de futebol, e não a considerar sucesso apenas o resultado dentro de campo.

– A mídia, que transmite o evento, precisa entender seu papel na formação de um produto de qualidade. É aceitar sentar e dialogar em vez de usar o fator econômico para não perder o poder e manipular o futebol como quer para continuar a pagar pouco por ele.

– Os patrocinadores, da mesma forma, precisam entender que eles também precisam valorizar e melhorar os seus parceiros.

– Os torcedores são aqueles responsáveis por financiar e fiscalizar o bom andamento do futebol. É o dinheiro dele que dói na hora que há uma má gestão de um clube, quando um atleta vai embora, etc. Se ele paga por isso, precisa cobrar também.

E aí entramos na questão crucial, que é a melhoria daqueles que trabalham diretamente no futebol.

Os atletas, a grosso modo, começaram um movimento ainda desordenado, mas importante, de questionamento e enfrentamento. Baseados na experiência que viveram ao jogar no exterior, começaram a pedir melhores condições de trabalho por aqui.

Os dirigentes aos poucos se qualificam, mas raros são aqueles bem preparados que chegaram ao topo da cadeia. Ainda são os mesmos de 30, 40 anos atrás, que dominam e ditam os rumos do futebol.

E os treinadores são apenas o reflexo dessa cadeia empobrecida. Sem a qualificação do todo, como é possível exigir deles um bom desempenho?

As empresas que são líderes de mercado e conseguem manter-se no topo são quase sempre aquelas que apresentam maior capacidade de inovação. São aquelas que não param no tempo, que estão a todo instante se adaptando às mudanças que o mundo impõe.

Por isso, trocar Parreira por Rinaldi não muda nada. Da mesma forma que dificilmente mudaria muita coisa trocar Scolari por Guardiola (no máximo conseguiríamos jogar um futebol mais coletivo).

O futebol brasileiro perdeu sua capacidade de inovação, que é muito diferente de improvisação. Enquanto não estimularmos a inovação, estaremos fadados a tentar viver de lampejos de improviso. Em 2014 ficou provado que isso não resolve mais.

 


A Copa que nos apresentou para o futebol
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Erich Beting

Havia duas incertezas muito grandes para mim antes do início da Copa.

A primeira, que não era só minha, era a nossa real capacidade de realização do evento. Nossa história sempre foi baseada no improviso. É cultura brasileira. É acreditar, e trabalhar para que “no fim dê tudo certo”. Confesso que tinha muito receio, com base no que vivenciei na Alemanha, em 2006, e na África, em 2010, de que fosse ser possível fazer tudo correr bem mesmo sem estar 100% preparado e ajustado para receber o Mundial.

Mais uma vez, nossa habilidade em improvisar foi colocada à prova. E passamos no teste com louvor!

A outra dúvida era com relação ao comportamento do público durante o evento. Achava, e aí era achismo puro, que o brasileiro não se empolgaria tanto pelo evento. Somos, também culturalmente, mais propensos a gostar da Copa do Mundo enquanto o Brasil faz parte dela. Quando não jogamos, também não acompanhamos o torneio. O brasileiro, afinal, gosta mais do Brasil que do futebol.

Nesse caso, a surpresa foi muito, mas muito mais positiva. A Copa do Mundo, afinal, nos ajudou a apresentar para o futebol. A facilidade de acesso da mídia às seleções ajudou muito nisso. Com equipes muito maiores, nossos veículos foram buscar histórias que iam além do que apenas a rotina maçante da “empolgante” seleção brasileira em Teresópolis. Foi uma das primeiras vezes em que tivemos jornalistas acompanhando todas, ou quase todas, equipes.

Isso ajudou, e muito, para que a audiência da Copa na TV crescesse como nunca. O Mundial de 2014 foi um dos que apresentou os melhores índices de audiência nos jogos em que o Brasil não estava em campo.

Essa situação nos leva a um grande aprendizado para o futebol que segue depois da Copa. Interesse em consumir o futebol existe, desde que não seja dada ao consumidor meia dúzia de opções.

No fim das contas, quebrei a cara com as duas grandes dúvidas que tinha. Ainda bem! A Copa do Mundo foi espetacular em diversos sentidos. Problemas existiram, é claro, mas o evento em si superou as expectativas. O clima contagiante seguiu até mesmo após o encerramento do jogo que consagrou a Alemanha, pelas ruas do Rio de Janeiro tomado por argentinos, alemães e bralemães.

Esse é o grande barato do futebol. Poder torcer não apenas pelo seu time, mas pelo jogo bem jogado.

Garantir uma grande cobertura de mídia e o interesse do público num evento que não seja a Copa do Mundo é o próximo grande desafio do Brasil. É parte da nossa lista de tarefas para fazer o futebol voltar a ser motivo de orgulho, e não apenas receber um bom evento de futebol.


Agora, Alemanha dá aula de como ganhar o Brasil
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Erich Beting

Semifinal da Copa do Mundo de 1962. O Chile, país anfitrião, é derrotado por 4 a 2 pelo Brasil e dá adeus ao sonho do título. Quatro dias depois, a seleção brasileira seria bicampeã mundial e daria a volta olímpica no estádio Nacional empunhando uma bandeira chilena, para delírio do público, que assumiu a torcida pelo Brasil.

Semifinal da Copa do Mundo de 2014. O Brasil, país anfitrião, é derrotado… (ok, para poupar nosso fígado, vamos parar por aqui).

No dia seguinte ao rolo compressor da Alemanha, jogadores e a própria federação alemã usam as redes sociais para pedir desculpas ao povo brasileiro, relembrar a história vitoriosa de nosso país e reforçar a importância do futebol brasileiro para o mundo. Derrotas acontecem, os alemães apenas fizeram seu papel de ganhar o jogo, etc.

A humilhação imposta pelos alemães não consegue gerar ódio ao time vencedor. Apenas temos de nos curvar diante da superioridade técnica e tática que foi demonstrada pela seleção germânica e tentar aprender com isso. Mas é curioso como parte dessa situação tem ligação direta com o comportamento dos vencedores durante e após a partida.

O preparo que a Alemanha fez para disputar a Copa do Mundo por aqui vai além das quatro linhas. Os alemães também vieram dispostos a ganhar não só do Brasil, mas principalmente o Brasil. Para isso, têm dado um show de comunicação.

Uso de redes sociais com declarações em português, interação máxima com não apenas a população local, mas com parte da história do país, como as tribos indígenas, juras de amor ao país (é só seguir as redes sociais do Podolski para ver). Até mesmo a camisa Rubro-Negra, imitando a do Flamengo, que foi um projeto da Adidas, mostra-se agora extremamente bem-sucedido.

O fato é que a Alemanha deu uma aula. Aniquilou dentro de campo o time local e, fora dele, está há cerca de um mês trabalhando a imagem para ser simpática e, assim, ganhar a torcida local. Tal qual fez o Brasil em 1962, os alemães podem terminar dando a volta olímpica no Maracanã com a bandeira verde-amarela, fechando com chave de ouro o planejamento montado para esses cerca de 30 dias inesquecíveis no Brasil.

Seria a comprovação do velho ditado de que gentileza só gera gentileza…


A temerária covardia dos patrocinadores da seleção
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Erich Beting

“Mostra a tua força, Brasil”, “Imagine a festa”, “#tamoconectado”, “#jogapramim”, “Ouse ser brasileiro”, etc.

Esses foram alguns dos bordões usados pelos patrocinadores da Copa do Mundo e/ou da seleção brasileira nos últimos 45 dias para tentar aproveitar o momento do Mundial e engajar-se com o torcedor, pegando carona no desempenho do time brasileiro em campo.

Na terça-feira, tão logo terminou o desastre no gramado do Mineirão, mantive a TV ligada sedento pelo intervalo comercial. Entrou o intervalo da Globo, quase meia hora após o jogo, e nada…

Nenhuma propaganda do Itaú, da Brahma ou da Sadia. A Hyundai continuava com a hexagarantia, que antes era atrelada à vitória do Brasil, mas que teve logo no início da Copa de mudar na Justiça para algo como “durante a Copa quem comprar o carro terá seis anos de garantia de fábrica”. A Johnson, com o seu “carinho inspira carinho”. A Oi e a Coca-Cola mantinham a campanha que sempre circulou e que pouco tinha a ver com o Brasil em si, mas muito mais com serviços (no caso da operadora de telefonia) e com o Mundial (no caso da Coca).

Onde estavam os que ousaram ser brasileiro? Os que arriscaram tudo? Os que amarraram o amor na chuteira? E os que pediram para que jogassem para eles? E a festa? Ainda era para imaginar ou tinha acabado?

Bom, já que não tinha nada na TV, vamos para as redes sociais. Ali pulsa a Copa do Mundo. Nunca antes um Mundial foi tão comentado, curtido e compartilhado como este… Tanto que, há alguns dias, o periódico “Meio & Mensagem” trazia extensa reportagem sobre os QGs montados pelas marcas, carinhosamente apelidados de “salas de crise”, em que dezenas de pessoas ficavam ali, monitorando freneticamente o que se passa em Facebooks, Twitters e congêneres.

Por lá, só a Garoto brincava que havíamos experimentado um chocolate indigesto, seguindo a linha do “Chocolate Neles” no momento em que o chocolate foi “deles”. A Visa decretava a quarta-feira de cinzas. A Gatorade, que sempre disse que o suor fazia mágica, saudava o Brasil mesmo na derrota e nos mandava voltar para o treino, que é onde se ganha jogo (parece que só o Felipão esqueceu isso). A Coca-Cola tinha um canudo com o “nó na garganta”. E uma ou outra marca relembrava o desastre a seu modo.

Mas nada de saber se ainda era para arriscar tudo, amarrar o amor na chuteira, imaginar a festa, conectar ou desconectar.

As marcas que mais investiram em campanhas de mídia para promover o Brasil na Copa do Mundo tinham simplesmente desaparecido!! Pior, algumas tinham decidido tirar do ar a comunicação que foi motivo de euforia até horas antes e ficar quieta, como se nada tivesse acontecido nos últimos 40 dias.

Em 2006, entrou para a história a falta de timing do banco Santander, que criou uma enorme campanha envolvendo os atletas da seleção e, quando o Brasil perdeu da França, a campanha publicitária que foi ao ar era a mesma de antes do fracasso. Da mesma forma, não por erro da marca, em 2010 o Extra ficou marcado por “eliminar” com uma rodada de antecedência o Brasil, num erro que pode ser creditado à “Folha de São Paulo” de ter colocado o anúncio que estava preparado para o caso de derrota brasileira em vez daquela da vitória.

Agora, porém, o buraco é muito, mas muito mais embaixo.

Um dos maiores aprendizados que a Copa deixa para as marcas é que é importante “defender” o patrocínio. Tivessem os patrocinadores desde o começo apostado e valorizado na realização do Mundial, provavelmente o clima pré-Copa tivesse sido muito melhor, com mais ganho comercial até mesmo para eles.

Poucas marcas resolveram realmente apostar nisso. E estavam se dando muito bem, como o Itaú com a excelente música “Mostra a Tua Força Brasil”, ou a Brahma, com a iniciativa de não só imaginar, mas realizar a festa para torcedores em 700 diferentes cidades com grandes necessidades pelo país.

Só que, quando o time desandou dentro de campo, a comunicação desandou junto. Faltou coragem para as marcas assimilarem o golpe e reconhecerem o óbvio. Sem ufanismo ou euforia, mas enaltecendo o patrocínio à seleção brasileira. Nesse sentido, só a Sadia, com campanha em mídia impressa, trocando o #jogapramim por #tamojuntinho, conseguiu manter-se fiel ao que havia criado.

Nenhuma outra empresa buscou assimilar o golpe e criar uma comunicação de amparo ao time brasileiro.

O problema dessa covardia dos patrocinadores é que, com isso, eles começam a deixar, no consumidor, a pior imagem possível. O grande segredo de uma relação positiva entre marcas e esporte é o entendimento de que é preciso apoiar vitoriosos e derrotados, a seu modo, claro, e sempre respeitando a essência do esporte.

Quando só há preparação para se comunicar nas vitórias, o patrocínio passa a ser visto, pelo consumidor, como oportunista. E isso é o maior risco para as marcas. O “#tamojunto, #peronomucho” que se viu agora no caso da seleção brasileira é a prova de que os patrocinadores ainda precisam aprender, e muito, a trabalhar a comunicação no esporte.

O mundo cada vez mais conectado exige das empresas agilidade e competência na comunicação. A covardia que se mostrou no caso do desastre da seleção brasileira explica, e muito, como as empresas ainda não aprenderam a trabalhar com esporte no Brasil.